Nesse artigo, vamos ver tudo sobre o mercado da prata, e quando eu digo tudo é tudo mesmo, vai ter gráfico, vai ter comparação com ouro, vai ter história da prata, métricas desse mercado. Você vai entender até porque a prata é inimiga do juros.
E o intuito aqui é entregar o máximo de informações sobre prata pra você que pensa em investir ou fazer day trade em prata, mas não confunda com recomendação de investimentos, o que vai definir se você vai investir ou não em prata é o seu perfil de risco e a sua estratégia.
Vamos começar do zero: Prata é um metal precioso, legal, isso todo mundo sabe, mas talvez você não saiba que esse elemento é conhecido por ser o elemento mais reflexivo, condutivo e maleável da natureza, e como tal, valorizado pela humanidade já há 5 mil anos.
Além de ser usada tradicionalmente como moeda e em jóias, atualmente ela tem diversas aplicações práticas, na indústria eletrônica, médica e de energia. Por isso, são minerados todo ano 25 mil toneladas de prata, um mercado de 20 bilhões de dólares. Mas onde começou toda essa relação da humanidade com a prata?
A História Milenar da Prata
Os primeiros objetos de prata no registro histórico são de 5 mil anos atrás, na Anatólia, atual Turquia, e já são objetos complexos, como jóias, moedas e prataria doméstica, indicando que a prata já era trabalhada bem antes disso, e com o mesmo propósito que ela viria a ter ao longo de toda a sua história: como jóia (um símbolo de riqueza) e como moeda (uma reserva de valor).
Depois dali, novas minas começaram a aparecer, como em Atenas, que floresceu na antiguidade após descobrir o depósito de prata de Laurion, com o qual financiaram seu império naval e cunharam o dracma, a moeda da Grécia Antiga, que filósofos como Sócrates e Platão usavam no dia a dia.
Já por volta do ano 100, o centro de mineração do império romano era a Espanha, cuja prata criou o denário, a moeda de prata romana que deu origem ao termo ‘dinheiro’, e pagava pelo comércio de especiarias com o extremo oriente, por meio da rota da seda. E no século VIII, os anglo-saxões cunharam moedas de prata chamadas ‘sterling’, que deram origem à atual libra esterlina.
O Cerro Rico de Potosí
Mas nenhum evento na história da prata se compara ao que aconteceu quando os espanhóis descobriram Potosí, na atual Bolívia. Ao chegarem às Américas no fim do século XV, existia uma lenda entre os europeus de que havia uma cidade de ouro escondida na floresta, o El Dorado. Os espanhóis acabaram não encontrando uma cidade de ouro, mas sim, uma montanha de prata: o Cerro Rico.
O ano era 1545, e o pastor de lhamas Diego Huallpa se perdeu a 4 mil metros de altitude, onde nem árvores crescem mais, e decidiu fazer uma fogueira para passar a noite. Reza a lenda que quando ele acordou, pensou que as estrelas haviam caído ao se ver rodeado de prata, que os espanhóis já haviam encontrado no México.
A notícia correu os povoados e, da noite para o dia, milhares de pessoas começaram a chegar de todo canto. Em alguns anos, a cidade chegou a 150 mil habitantes, muitos deles enlouquecendo devido à intoxicação por mercúrio, que passou a ser usado para separar a prata da rocha, ao amalgamar ela com o mercúrio.
O Cerro Rico se tornou a fonte de simplesmente 70% da prata do mundo. Todo o poder que a coroa espanhola teve nos séculos seguintes, com guerras pela Europa e expansão pelo mundo, foi financiado pelo ‘Real de Ocho’, a moeda de prata que a coroa espanhola cunhava ali mesmo, em torno das minas de Potosí, e da onde veio o símbolo do cifrão.
Da Inflação na Espanha à Queda do Mercantilismo
O fluxo de prata pra Espanha foi tão grande, que após alguns anos o preço de tudo subiu na economia: uma inflação generalizada devido à grande quantidade de prata em circulação, o que foi a ‘bala de prata’ pra derrocada do mercantilismo, o sistema econômico que vigorava entre as potências européias antes do capitalismo.
A idéia do mercantilismo é que a riqueza de uma nação vinha do acúmulo de metais preciosos, como o ouro e a prata, e após essa ‘revolução do preço’ na Espanha, começamos a entrar no paradigma capitalista, em que a riqueza de uma nação advém não do acúmulo de metais, mas sim da produtividade e da inovação.
A Geopolítica da Prata e a Guerra do Ópio
A moeda de prata fez da Espanha uma potência e foi a moeda internacional por quase três séculos, aceita da América à China. 200 anos depois, toda a prata havia sido mineirada e Potosí voltou a 8 mil habitantes. A Espanha, que havia tido sua prata esgotada pelos romanos, agora esgotara a prata das Américas, e pelo mesmo motivo: para comprar seda, chá e porcelana.
A própria Argentina tem esse nome devido ao termo latino para a prata, que é ‘argento’, que também dá nome à prata na tabela periódica: Ag. Inclusive um cara que eu sou fã, Adam Smith, na sua obra ‘A Riqueza das Nações’, menciona a grande quantidade de prata que a Europa enviava para a China todo ano para importações.
E pra reduzir essa quantidade de prata enviada pra China, a Inglaterra começou a pagar pelos produtos chineses em ópio, que eles produziam na Índia, o que viciou milhões de chineses, e gerou as duas guerras do ópio em que a China se viu ocupada por várias potências europeias nos anos 1860, e que tem ramificações na psiquê chinesa até hoje.
A Prata como Moeda
Todo esse poder da prata em mover os humanos, deriva do fato de ela ser universalmente aceita como valiosa. Romanos, chineses, espanhóis, povos de todo lugar e época atribuem valor a esse metal. São 4 fatores principais que fizeram a prata ser adotada como moeda pela humanidade:
Durabilidade:
a prata é um metal durável e que podia ser guardado na família por várias gerações. Só depois da revolução industrial é que os objetos de prata passaram a ficar corroídos devido ao enxofre no ar. Então, hoje em dia, se você tem prataria de família, você pode ver ela escurecer, mas não era o caso antigamente, e é só passar bicarbonato que resolve;
Maleabilidade:
você pode fazer folhas de prata mais finas que um fio de cabelo, sem ela quebrar, o que nos permitiu trabalhar a prata e cunhar moedas com o escudo ou brasão do emitente;
Acessibilidade:
existe muito mais prata do que ouro no planeta, o que favorece a prata para uso em transações comerciais. Devido à raridade e ao valor do ouro, você dificilmente vai comprar um pão com ele, mas com moedas de prata você tem essa abundância maior do material, mas ainda assim sendo um bem escasso;
Aceitação:
ao longo do tempo, o uso da prata como moeda se difundiu pelo planeta e criou uma relação de confiança entre os povos, que sabiam que, em qualquer lugar aquele metal seria aceito para trocar por mercadorias. A prata permitiu o comércio global.
A Relação Ouro-Prata
Apesar de existir quase 20 vezes mais prata do que ouro na Terra, só é minerado 8 vezes mais prata que ouro, e 70% da prata é usada para fins produtivos, em eletrônicos e painéis solares, menos de 30% da prata minerada é para investimento, o que gera dinâmicas diferentes com o mercado do ouro em que quase toda mineração do ouro é pra investimento: menos de 10% do ouro é usado para algum fim, que não o investimento.
Apesar de ouro e prata oscilarem na maior parte do tempo na mesma direção, a oscilação diária da prata nas últimas 5 décadas foi de quase 1%, o dobro da oscilação do ouro. Isso porque o mercado de prata é muito menor que o de ouro, cerca de 10 vezes menor: o mercado da prata física é de 20 bilhões, e do ouro de 200 bilhões de dólares por ano.
Então, um fluxo de dinheiro no mercado de prata, entrando ou saindo, tem um impacto maior do que o mesmo aporte no mercado de ouro, o que traz mais volatilidade, o que é bom pro trader. Esse mercado tem boa liquidez e volatilidade, e não se restringe a esses 20 bilhões minerados de prata, o mercado de derivativos é alavancado em centenas de vezes, chegando a trilhões de dólares em valor.
Em lugares como o antigo Egito e o Japão medieval, que tem menos minas de prata, a razão ouro/prata chegou a 3/1, mas a tendência histórica eram os governos instituírem uma relação fixa, que até os anos 70 era de 15/1, chegando a 100/1 em momentos como a 2ª Guerra Mundial e na pandemia.
>> Veja também: Tudo sobre a Platina
A Mineração da Prata
70% da prata é extraída como um subproduto da mineração de outros metais, como o ouro, ou chumbo, zinco, cobre, para então passar pela fundição e refino e se obter a prata em sua forma pura, pronta para ser utilizada por diversas indústrias.
Atualmente, são mineradas 25 mil toneladas de prata por ano, e é estimado que ao longo da história humana, um total de 1,5 milhão de toneladas de prata já tenham sido minerados, o que caberia em um cubo de prata sólido de 52 metros em cada lado, e a estimativa é que ainda tenham 500 mil toneladas de prata a serem mineradas.
Então pessoal, desde o final do século XIX, avanços como a perfuração a vapor e drenagem de minas trouxeram um aumento massivo na produção global de prata. É estimado que, só entre 1950 e 2020, foram extraídos 60% do total da prata minerado na história, sendo que nos 50 anos entre 1900 e 1950, já tinham sido minerados mais do que na história humana anterior inteira.
Existe o risco real de nós esgotarmos as reservas de prata do planeta daqui a algumas décadas, mas provavelmente até lá já teremos novas tecnologias para evitar isso.
Jóias e Cinema: O Uso Industrial da Prata
Os avanços científicos no século XX também desvendaram que a prata era um dos elementos mais versáteis da tabela periódica. Além das tradicionais jóias e moedas, o poder reflexivo dos sais de prata foi fundamental pro surgimento do espelho, da fotografia e do cinema. 25% da demanda industrial por prata ainda vem da fotografia, outros 35% para joalheria e prataria, e outros 40% por outras indústrias, com somente 3% ainda sendo usado em moedas.
Componentes eletrônicos como condutores e painéis solares, aproveitam o fato de a prata ser o melhor metal para conduzir eletricidade. Se você tem um celular ou computador, você carrega por aí a nanoprata, que são micropartículas de prata pulverizadas nas superfícies plásticas do celular para conduzir a eletricidade e proteger contra bactérias. Por isso os maiores compradores de prata do mundo são: Samsung, Apple, General Eletric e Panasonic.
A Prata na Medicina
Uma curiosidade que me surpreendeu quando eu descobri, é que a prata tem propriedades antimicrobianas. Então, na antiguidade, pedaços de prata eram deixados em recipientes de água e vinho para preservar. Inclusive na conquista do oeste, os americanos cruzavam o país com prata no leite pra não estragar.
Desde os anos 1960, a prata virou parte de superfícies cirúrgicas e instrumentos hospitalares, pois os íons de prata agem desativando as membranas de microrganismos. A prata é usada em curativos, colírios, cremes e na proteção de queimaduras.
A Demanda por Prata: Setores Principais
É importante entender essas aplicações industriais da prata, pois se houver, por exemplo, uma demanda maior por energia solar, que é 10% da demanda por prata, o preço da prata vai aumentar. Novas aplicações médicas para esse metal, ou mais carros elétricos, também, vão gerar maior demanda por prata e outros metais. Cada carro elétrico leva até 3 kg de prata em seus componentes. A demanda por prata, então, vem dos seguintes setores:
(imagem Usos prata)
saúde;
eletrônica;
energia;
joalheria;
automóveis.
A Supernova e o Surgimento da Prata
Existe 20 vezes mais prata do que ouro no nosso planeta, devido à forma com que esses metais preciosos se formaram. A prata pra quem não sabe, não é criada debaixo do solo, como o Petróleo (confere meu artigo sobre petróleo quando acabar esse). A prata que a gente vê hoje, foi criada há bilhões de anos atrás, quando estrelas com 8 vezes mais massa que o Sol, chegavam ao fim de seu ciclo e explodiam em supernovas.
A maioria das estrelas, como o Sol, tem uma massa menor do que a necessária para criar metais pesados. Ou seja, toda a prata do nosso planeta foi criada em uma supernova há bilhões de anos atrás, chegou no nosso sistema solar junto com outros elementos e se misturou na crosta terrestre.
O motivo de haver 20 vezes menos ouro na Terra, é que o ouro (número atômico 79) é criado em um evento ainda mais raro que a supernova: após uma estrela colapsar na supernova, ela se torna uma estrela de nêutron, e quando ocorre uma colisão entre duas estrelas de nêutron, são geradas condições ainda mais extremas de temperatura e pressão, e os elétrons dos átomos se fundem em elementos ainda mais pesados, como o ouro e o urânio (92 na tabela periódica).
A Raridade Faz o Preço
Então, parte do que faz algo mais ou menos valioso pro ser humano é o quão escasso é aquele elemento. A prata depende de uma supernova pra surgir e boa parte da prata na superfície do nosso planeta já foi extraída. Isso atrai o investidor para ter uma parcela do patrimônio em prata, já que é uma boa reserva de valor.
Então estima-se que existam 2 milhões de toneladas de prata na Terra, sendo que ¾ já foram minerados, e 90% de toda a prata já foi extraída, consumida e até descartada.
A unidade de medida dos metais preciosos é a ‘onça-troy’, que equivale a 31,10 gramas. Então, por exemplo, a onça-troy do ouro, ou 31 gramas de ouro, custa ali 1.800 dólares, a da platina 900 dólares, a prata, 30 dólares a onça. Cada material vai ter o seu preço e é negociado com seus próprios derivativos.
Ativo Físico: Barras de Metal
Existem diversas formas de investir em metais, desde a compra de barras físicas de prata, que têm um custo maior na compra e no armazenamento. Para alguns a prata não é nem um investimento, é uma reserva de valor. Digamos que o governo começa a imprimir muito dinheiro e a inflação dispara, quem tem prata consegue se proteger de uma situação dessa.
Mas se eu compro uma barra de prata e deixo na minha casa ela fica dando sopa, eu posso perder no meio da minha bagunça, ela pode ser roubada se alguém invadir minha casa. Então quando se fala em investir em prata, na maior parte do tempo a gente está falando em abrir o seu computador e logar numa plataforma de negociação.
Ativo Financeiro: Derivativos e ETFs
Se eu quero fazer operações de curto prazo, day trade, eu negociaria um derivativo como o silver. Mas se eu quisesse investir para o longo prazo, eu buscaria talvez um ETF.
Ou seja, a gente não negocia prata física, trader, ou mesmo investidor, 99% do tempo vai lidar com instrumentos financeiros podendo usar alavancagem, podendo operar vendido, ou seja, lucrar com a queda do preço da prata. É engraçado, que dá para você fazer centenas de milhares de dólares de lucro negociando prata sem nunca ter de fato tido contato físico com esse metal precioso.
O Dólar e o Fim do Padrão-Ouro
Quase que eu esqueço de mencionar que até 1965, cada moeda de dólar ainda continha um pouco de prata. A emissão de dólar era atrelada à uma quantidade de prata e ouro que o governo tinha nos cofres, a uma razão ouro-prata de 15/1. Por esses metais serem escassos, isso dava mais confiança de que o governo não iria imprimir quanto dinheiro quisesse e gerar inflação.
Só ao longo do século XX, a base monetária, que é a quantidade de dinheiro em circulação, foi sendo desvinculada da prata e do ouro, principalmente depois do fim do padrão ouro-dólar, em 1971, quando dinheiro passou a ser fiduciário, que depende da fé, da confiança das pessoas, e não mais pelo lastro em metais preciosos.
Prata: A Inimiga dos Juros
Mas por que a prata é inimiga dos juros, como eu disse no início do vídeo?
Em geral, quanto mais um país sobe a taxa de juros para conter a inflação, mais incentivo os investidores terão de tirar o dinheiro de metais como prata, e investindo em ativos que rendam juros. Como a prata não paga juros, quanto mais alto o juros, menos atrativo pro investidor alocar o dinheiro dele em prata.
Ah mas o mercado de ações também fica menos atrativo, sim, mas tem ação que pelo menos vai ta gerando dividendos pro investidor, a prata não vai te render. Ou você ganha com a oscilação do preço, ou você pelo menos se protege de uma inflação exagerada, como a gente está vendo com a moeda da Argentina.
Além disso, a prata é mais sensível às taxas de juros, já que o aumento dos juros aumenta o endividamento das empresas que utilizam a prata, reduzindo assim a demanda pelo metal.
A Defesa da Carteira com Metais Preciosos
Já o ouro, em tempos de incerteza econômica, é buscado como reserva de valor, e em caso de inflação e quebra da confiança na economia, haverá mais demanda por ouro como porto seguro e o preço dele vai subir, enquanto uma economia desacelerando vai reduzir a demanda por prata e aumentar a por ouro, causando as alterações na razão ouro-prata.
Um metal como a prata funciona na sua carteira de forma defensiva, como algo que mantém seu valor no tempo, independente da inflação do papel moeda, e não é algo que vai rentabilizar em 300% sua carteira, é proteção. Você não vai ficar rico com a valorização da prata, mas você também não vai ficar extremamente pobre se o seu governo perder a linha na impressão de dinheiro, a prata vai conservar patrimônio.
Quem Produz e Quem Consome Prata
Atualmente, o maior produtor de prata do mundo é o México, com 6.600 toneladas/ano, 20% da produção mundial. Em seguida, o Peru e a China, com 4 mil, e a Rússia e Polônia com menos de 2 mil toneladas por ano cada. Até hoje, o México e o Peru estão entre as maiores fontes de prata do planeta.
Algumas das maiores mineradoras de prata do mundo são mexicanas, como a Penoles e a Fresnillo. O Canadá também é sede das maiores mineradoras do globo. Esse mercado não tem sazonalidade como o das commodities agrícolas.
Confere o meu vídeo sobre a prata com imagens sensacionais dessa commodity metálica: